“A Origem” demonstra o quanto Nolan é mais do que um grande diretor. Ele é, sim, um mestre em costurar tramas complexas e manipular imagens e sons em prol de histórias cheias de camadas, narrativas ou de interpretações. Mais do que um mero filme, “A Origem” é cinema em sua essência, construído por meio de uma edição absurdamente coerente e eficiente. É também a prova de que Nolan possui um olhar apuradíssimo e quase milimétrico para a sétima arte, seja para a composição de planos e imagens de cair o queixo, seja no modo como conduz com mãos quase cirúrgicas uma trama que poderia deixar metade da platéia confusa ou entediada.
Mas para nossa sorte, o longa é qualquer coisa menos confuso ou chato. A trama que envolve sonhos e sonhos dentro de sonhos é complexa, mas Nolan tem o talento necessário para deixá-la compreensível aos olhos do espectador. Isso tudo ainda com o bônus de não torná-la cerebral demais, apostando nos talentos de Leonardo DiCaprio – o ator mais interessante da atualidade e que dá um tom diferente a um papel bem parecido ao que ele mesmo interpretou em “Ilha do Medo” – e Marion Cotillard para dar ao filme um viés mais emocional. Os dois estão devidamente acompanhados por um elenco de peso e que embarca sem reserva no conceito da obra (Tom Hardy, Tom Berenger, Ellen Page, adorável atriz teen, promissora no ramo da sétima arte, Cilliam Murphy e Ken Watanabe). Mas o destaque do elenco, porém, recai sobre Joseph Gordon-Levitt (Arthur) que se sobressai sempre que surge em tela, seja demonstrando a seriedade de seu personagem nas cenas de ação, seja servindo de alívio cômico em algumas partes (provável futuro vilão Charada de Batman 3).
O resultado é um longa inteligente e envolvente narrado de forma magistral e que vai crescendo no conceito da platéia, o que é cada vez mais raro de se ver atualmente.
Cenas de ação
Sim, as explosões e as cenas de ação estão lá, nenhuma gratuita ou estendida à exaustão. Cada uma delas funciona como parte integrante de uma história que apresenta seus elementos aos poucos, em meio a uma direção de arte impressionante e uma trilha sonora ora emotiva, ora funcional. Pode não ser um longa fácil ou mesmo acessível para todos, ainda que a personagem de Ellen Page funcione como um espelho da platéia, sempre se questionando ou buscando respostas. Mas é o melhor exemplo do que o cinema atual ainda é capaz de fazer. “A Origem” é um filme que pede para ser visto novamente. E é um longa que se revê com prazer. Não é todo dia que se assiste a um filme assim. Não mesmo.
Na trama, Dom Cobb (Leonardo DiCaprio) é um expert em invadir os sonhos das pessoas para roubar segredos do inconsciente que possam ser usados por empresas concorrentes. Um poderoso empresário (Ken Watanabe) propõe à Cobb e sua equipe, justamente o contrário: Ao invés de extrair uma informação, implantar uma ideia na mente de um indivíduo. Neste caso, Robert Fischer (Cillian Murphy), o filho de um magnata às portas da morte. O personagem de Watanabe quer que o herdeiro dissolva o império do pai, evitando assim a hegemonia por parte de uma única corporação. Nasce aqui a trajetória pelo mais profundo elemento do ser humano: a mente. No subconsciente, nada pode ser ocultado e cada um terá de aprender a controlar as suas memórias, recordações e percepções. A missão é altamente arriscada, cheia de obstáculos difíceis de ultrapassar. Sobretudo quando as realidades se confundem, quando a mente teima em dissolver as fronteiras entre o sonho e o real.
A Origem é um filme complexo, mas o diretor consegue desenvolver a trama sem ofender a percepção do público. O mérito é que o filme nos faz pensar nas inacabáveis possibilidades da mente humana ao mesmo tempo em que nos brinda com um visual estonteante e cenas de ação brilhantes, com destaque para a batalha de Artur conta a falta de gravidade em uma das dimensões. A cada peça montada do quebra-cabeças de A Origem, você percebe que está diante de uma obra-prima. A imagem final do quebra-cabeças vai depender da sua interpretação, mas é exatamente isso que vai fazer o filme se fixar na sua cabeça por um bom tempo. Talvez Nolan tenha usado o truque do filme para plantar uma idéia em nossa mente.
Posso parecer exagerado, mas se tivesse que apontar algum defeito em A Origem, seria em seu estapafúrdio título nacional. A “inserção”, que é o argumento do thriller, faria muito mais sentido. A Origem, no entanto é o MELHOR filme de 2010 juntamente com Toy Story 3. E um dos melhores dos últimos anos. Sorte nossa que Nolan conseguiu construir seu caminho pelo mundo do cinema e nos presentear com a sua melhor história até hoje.
Thiago Souza
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